"Fugimos do abismo da vida, e fugimos da vida - embora tal seja uma autentica estupidez. Se fugimos da vida, caminhamos para o abismo; se fugimos do abismo, abraçamos o calor frio da vida. E talvez porque somos humanos, voltamos novamente a perder o comboio, e novamente, e novamente - e assim continuamos, e assim caímos, e assim caem connosco. Perdemos quem amamos, perdemos quem odiamos [ódio este que somente demonstra que tais pessoas fazem parte do nosso espelho de vida].
Perdemo-nos - oh, como o comboio já lá vai!" - J. A.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Poltrona

Estou hoje sentado,
Na dor da convalescença.
Partido e escaqueirado na poltrona,
Sabendo já o que me espera:
A cor dos dias sem fim,
Entre fôlegos de azul-escuro
E de dourado,
Que escorrem, em fiapos,
Por entre os quadrados das janelas.
Dói-me o corpo,
Quebrado e quebradiço,
E a alma por ter memória;
Singram-me imagens pela cabeça,
Ecos que flutuam na sala,
Que vencem o som da voz e da televisão
E os gestos das mãos,
Feitos em vão.
Dói-me tudo, e as mãos
Largadas ao acaso sobre as calças
Ardem-me de uma dor que queima…
E antes queimasse,
Tudo à minha volta!
Mas deixo cair a cabeça para trás
E olho a janela de lado;
Afundo-me no quase-claro da sala
E descubro que, afinal,
O silêncio vazio da grande casa,
Não me faz jus à solidão.

Sem comentários: